José Luis Ruíz Peinado (Universitat de Barcelona)
Local e data de nascimento. Olinda (Pernambuco, Brasil) 1609
Local e data do óbito. Bemba (Congo) 1653
Missionário católico e professor das primeiras escolas religiosas para fidalgos na capital San Salvador del Congo. Devido ao seu conhecimento de várias línguas, participou do primeiro dicionário Kikongo/Espanhol/Latim.
Base de Dados BRASILHIS. http://brasilhis.usal.es/es/personaje/jose-ruiz-jose-de-pernambuco
A conexão da África do século XVI com a Europa e a América não pode ser compreendida sem o tráfico de escravos através do Atlântico. Foi a espinha dorsal das amplas relações e interesses que surgiram. O papel desempenhado pelos missionários foi cada vez mais proeminente na articulação de redes de influência e pressão, para além do seu trabalho pastoral. A conquista, a religião e o comércio foram parte fundamental da presença europeia no Atlântico. Além desses três elementos, os capuchinhos se envolveram nas redes políticas que criaram por meio de embaixadores e tratados que conectaram definitivamente diferentes povos e reinos nos tempos modernos. As diferentes missões dirigidas à África serão complementadas com as missões enviadas à América. Uma política articulada a partir da Monarquia Hispânica em colaboração com a Santa Sé, onde os capuchinhos formaram, junto com os jesuítas, a vanguarda da expansão do cristianismo na África Central e da Tierra Firme na América.
Os personagens e redes religiosas que interagiram nesse período, nos diversos continentes, o fizeram sob a mesma premissa de expandir a Orbis Cristiana a serviço de diferentes monarquias.
A secessão de Portugal em 1640 não alterou este contexto, uma vez que a Santa Sé considerava a coroa espanhola como depositária de legitimidade. A vanguarda do catolicismo expansionista nos tempos modernos foi liderada por jesuítas e capuchinhos, com forte rivalidade entre as duas congregações, os jesuítas estavam sujeitos ao padroado português, enquanto os capuchinhos aderiram à Propaganda Fide, que dependia diretamente de Roma. Como herdeiro do trono português, cabia ao monarca espanhol tomar as medidas cabíveis em relação à Propaganda Fide, criada em 1622.
Dessa forma, os missionários poderiam atuar sem restrições nas “quatro partes do mundo” (TARDIEU, 2002: 85). Da mesma forma que em outros reinos do cristianismo, a Igreja Católica foi colocada a serviço do poder real, tanto no Ocidente quanto em alguns reinos cristãos da África. Mas a hostilidade portuguesa, na presença de missionários espanhóis ou enviados das províncias religiosas espanholas nas áreas de influência do padroado real constituía uma fonte contínua de problemas e conflitos. Essas divergências terminarão após a derrota do reino do Congo em 1665, que impedirá a entrada de mais capuchinhos espanhóis na África Central Ocidental e, a partir de então, o deslocamento de muitos deles para a América espanhola.
Nosso personagem é o jovem pernambucano José Ruiz, que se mudará para a Península Ibérica para completar sua formação acadêmica. Nasceu em 1609 em Olinda, capitania de Pernambuco e aos 20 anos estava em Coimbra estudando no colégio da Companhia de Jesus, passando nas provas de gramática daquele ano. Mais tarde, mudou-se para Salamanca para completar seus estudos na Universidade desta cidade, passando os cursos de artes, filosofia e direito moral em 1630. Após vários anos de permanência, decidiu tomar o hábito em 20 de abril de 1634, sendo chamado, segundo as normas dos capuchinhos, José de Pernambuco. Em 1644 foi nomeado mestre de “notícias e gramáticas” no convento de Toro. No ano seguinte, fará parte do terceiro grupo de missionários capuchinhos da província de Castela que partem para a África com destino ao reino do Congo.
O seu conhecimento das línguas portuguesa e espanhola fez dele um candidato perfeito para esta missão. Sobretudo, o seu domínio do português facilitou-lhe ser o interlocutor dos seus companheiros castelhanos no território africano. Enquanto isso, a língua portuguesa era utilizada para as relações comerciais e a evangelização dos povos africanos e europeus nas costas da África Ocidental (ANGUIANO, 1950). Os europeus residentes na África, os intérpretes ou línguas (línguas em espanhol) dos diferentes reinos da costa, comunicavam-se
principalmente nessa língua (THORTON, 2004: 290).
O padre José de Pernambuco, através do aprendizado da língua kikongo, a mais usada no reino, lançou as primeiras escolas religiosas na capital para os nobres do reino, dando aulas de vários assuntos, incluindo gramática latina e espanhola, geografia, história, etc., e participou do primeiro dicionário Kikongo/Espanhol/Latim. Mais tarde, foi enviado para a Bata ou província de Nkusu, acompanhado pelo padre Teruel durante dois anos, e depois de gravemente doente foi para a banza de Bemba, onde morreu aos 44 anos em 1653 (TERUEL, 1664).
A figura de José de Pernambuco faz parte do trânsito destas redes de circulação entre o Brasil e os territórios da monarquia hispânica. Redes e intercâmbios que foram criados entre a África, América e Europa e que dariam origem a um novo espaço Atlântico.