Manoel Vaz Pereira


Nascimento: Lisboa.

Físico-Mor na Bahia. Médico do Partido em Olinda.

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Médico de origem portuguesa. Foi estudante da Faculdade de Artes na Universidade de Évora e da Faculdade de Medicina na Universidade de Salamanca. Bacharel em Medicina em 1600, pela Universidade de Salamanca. Físico-Mor do Presidio da cidade da Bahia e Médico de Partido da cidade de Olinda.

O médico Manoel Vaz Pereira nasceu na cidade de Lisboa, porém não há informação em qual ano. No entanto, se considerarmos os anos que cursou nas Faculdades de Artes e Medicina, além de que a idade mínima exigida era de 14 anos para poder ingressar nos cursos superiores, poderíamos estimar ter nascido por volta do ano de 1581 (geralmente quando o estudante era menor de 14 anos ou com idade avançada ao padrão de idade dos estudantes, era mencionado em sua matrícula)[1].

Estudou os três anos da Faculdade de Artes na Universidade de Évora. Em 21 de outubro de 1596 se matricula para o primeiro ano no curso de Medicina na Universidade de Salamanca[2]. Recebeu o título de Bacharel em Medicina no dia 2 de março de 1600[3], depois de frequentar os quatro anos de curso na Faculdade de Medicina em Salamanca[4].

Em 24 de janeiro de 1605, ainda morador na cidade de Lisboa, foi examinado pelo Físico-Mor real, Dr. Fernão Roiz Cardoso, e recebe a Carta de Medicina, recebendo a carta de medicina com a licença para exercer a profissão médica e para atuar em todos os Reinos e Senhorios de Portugal[5].

A partir dessa data não há informação de quando vai para o Brasil, mas em 1609 aparece na Folha de Ordenados a serem pagos na cidade da Bahia e em sua capitania, como Físico-Mor do Presídio. Recebia 40.000 réis anuais para “curar todos os soldados” do presídio da Bahia e fortes desta cidade. É o único profissional da saúde que aparece neste documento, assim que poderia também ter exercido as funções relacionadas aos ofícios dos cirurgiões e boticários[6]. Ou que os profissionais destes ofícios podiam ter sido contratados de maneira temporária e não fixa, quando havia necessidade, assim não figurariam na folha de ordenados. Podia ocorrer, por exemplo, que os medicamentos viessem de fora do presídio, a partir de algum boticário da área urbana, ou dos arredores, prática bastante habitual neste período.

Não é possível estimar quanto tempo esteve exercendo a medicina no Presídio da Bahia, mas em 2 de novembro de 1618 foi emitido um Alvará de Médico para o Dr. Manoel Vaz Pereira (Carta de Médico do Partido[7] de Olinda), para tratar dos enfermos, inclusive soldados, com ordenado de 20.000 réis por ano, a serem pagos pela Câmara de Olinda.[8]

Os “médicos de partido” ou “médicos camarários” eram médicos contratados e sufragados pelas câmaras municipais. Este sistema de contratação de médicos não se restringia somente a eles, mas também aos boticários. Sua origem vinha de um esquema de bolsas de estudos financiadas pelas Câmaras, para a formação destes profissionais, na Universidade de Coimbra (e no caso dos boticários, sob tutela). Foi instituído pela coroa portuguesa, a partir do ano de 1568, como forma de prover este mercado laboral, da área da saúde, que estava em crescimento em Portugal. Segundo Laurinda Abreu, era uma maneira que tiveram para redistribuir os recursos onde a financiadora, as Câmaras, eram as próprias beneficiadas, com seus serviços. Os cirurgiões, em contrapartida, que estavam fora deste esquema de bolsas, acabaram também se beneficiando, com estas articulações entre a Coroa e os poderes municipais[9].

A solicitação do provimento deste cargo e contratação do médico e cirurgião Manoel Vaz Pereira, partiu de solicitação da própria Câmara de Olinda, em virtude da necessidade que tinham de um médico residente[10]. A partir desta contratação, em 1618, não foi encontrada mais informação sobre este médico na documentação.

Ainda que saiba muito pouco sobre este médico e cirurgião, as reduzidas informações documentais sobre Manoel Vaz Pereira destacam uma trajetória profissional bastante usual. Muitos profissionais da saúde, sobretudo a partir do século XVII, buscavam agregar mais habilidades de atuação como maneira de melhor atender ao mercado de trabalho disponível[11].

Muitos médicos formados em universidades, como o português Manoel Vaz Pereira, também atuavam nas artes da cirurgia. Como era comum no período da Monarquia Hispânica, muitos portugueses empreenderam parte ou a totalidade de seus estudos na Universidade de Coimbra, mas também na Universidade de Salamanca (a segunda preferida)[12].

Durante o período de formação na Faculdade de Medicina, os estudantes médicos passavam por formação na área de cirurgia, tendo cátedras de anatomia e cirurgia, a partir do século XVI, tanto em Coimbra como Salamanca. Assim, na parte prática, acabavam tendo experiência e conhecimentos não somente na área teórica[13].

Portanto, as poucas contratações acabavam, forçosamente, agregando atividades professionais de mais um ofício. No caso de Manoel Vaz Pereira ainda se pode acrescentar o fato de ter atuado tanto na esfera militar como na civil, durante sua trajetória profissional, outra prática recorrente do período[14].


[1] Marcos de Dios, 1975.

[2] Livros de matrículas: AUSA 306, fl. 144v, de 21/10/1596; AUSA 307, fl. 140, de 13/11/1597; AUSA 308, fl. 141v, de 02/12/1598; e AUSA 309, fl. 140, 15/11/1599 (Marcos de Dios, 1975).

[3] AUSA 741, fl. 152v (Marcos de Dios, 1975).

[4] Marcos de Dios, 1975.

[5] ANTT, Chancelaria de D. Filipe II, liv. 22, fl. 340.

[6] AHU, AHU_CU_BAHIA-LF, cx. 1, D. 9.

[7] Na Espanha, também existia um tipo de profissional como os médicos de partido portugueses, com contratações realizadas a partir dos municípios, sobretudo rurais, de médicos, cirurgiões, boticários e veterinários. No território de Aragão, começam a aparecer a partir do século XVII, recebendo a denominação de “la conducta” ou “conducción”. Segundo Fernández Doctor y Arcarazo García, este termo teria derivado de sistemas equivalentes na Itália, que desde o período medieval, tinham os medici condotti, ou nas cidades de língua germana de Startdtzärzte, que significava “el contracto o acto de asalariar que el município hacía a un médico o a otros empleos públicos”. Estes autores afirmam que existia este tipo de contratações também nos territórios de Castela, onde se denominavam “Partido” ou “Medicatura”, desde o século XVI (Fernández, Doctor y Arcarazo García, 2002: 190).

[8] ANTT, Chancelaria de D. Filipe II, liv. 41, fl. 203.

[9] Abreu, 2018.

[10] ANTT, Chancelaria de D. Filipe II, liv. 41, fl. 203.

[11] Abreu, 2018.

[12]. Em menor medida, também estudaram medicina em universidades francesas e italianas (Marcos de Dios, 1975).

[13] Também fazia parte do curso de medicina, as visitas práticas que os estudantes de medicina faziam aos enfermos de hospitais, ou mesmo aqueles nas ruas, sempre acompanhados por um professor, um licenciado ou um mestre desta área (Marcos de Dios, 1975; Abreu, 2018; Silva, 2002).

[14] Abreu, 2018.


FONTES DOCUMENTAIS

– AHU, Arquivo Histórico Ultramarino, AHU_CU_BAHIA-LF, Cx. 1, D. 9.

– ANTT, Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Chancelaria de D. Filipe II, liv. 22, fl. 340.

– ANTT, Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Chancelaria de D. Filipe II, liv. 41, fl. 203.

– AUSA, Archivo de la Universidad de Salamanca, Libro 306, fl. 144v.

– AUSA, Archivo de la Universidad de Salamanca, Libro 307, fl. 140.

– AUSA, Archivo de la Universidad de Salamanca, Libro 308, fl. 141v.

– AUSA, Archivo de la Universidad de Salamanca, Libro 309, fl. 140.

– AUSA, Archivo de la Universidad de Salamanca, Libro 741, fl. 152v.

BIBLIOGRAFIA

– Abreu, L. (2018). A institucionalização do saber médico e suas implicações sobre a rede de curadores oficiais na América portuguesa. Tempo, Niterói, vol. 24, n. 3, p. 493-524. Recuperado em: https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=167057136005

– Fernández Doctor, A. y Arcarazo García, L. A. (2002). Asistencia rural en los siglos XVII y XVIII: Los tipos de “conducción” de los profesionales sanitários en Aragón. Dynamis. Acta Hisp. Med. Hist. Illus. n. 22, p. 189-208. Recuperado em: https://www.ugr.es/~dynamis/completo22/PDF/dyna-7.pdf

– Marcos de Dios, A. (1975). Portugueses en la Universidad de Salamanca (1580-1640). (Tese de Doutoramento). Universidad de Salamanca, Salamanca.

– Silva, J. M. (2002). Anotações sobre a história do ensino da Medicina em Lisboa, desde a criação da Universidade Portuguesa até 1911 – 1ª parte. RFML, Serie III; 7 (5): 237-249. Recuperado em: https://ordemdosmedicos.pt/wp-content/uploads/2017/09/Anotac%C3%B5es_sobre_hist%C3%B3ria_do_ensino_medicina_I_eII_2002.pdf

Autor:

Zeli Teresinha Company (Universidad de Salamanca)

Como citar este verbete:

Zeli Teresinha Company. “Manoel Vaz Pereira“. Em: BRASILHIS Dictionary: Dicionário Biográfico e Temático do Brasil na Monarquia Hispânica (1580-1640). Disponível em: https://brasilhisdictionary.usal.es/pt/manoel-vaz-pereira-2/. Data de aceso: 02/05/2024.

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